De acordo com dados da Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios (PNAD) 2015 a maior parte da população brasileira, 84,72%, vive em áreas urbanas. Já 15,28% dos brasileiros vivem em áreas rurais.
O intenso processo de urbanização no Brasil gerou o fenômeno da metropolização (ocupação urbana que ultrapassa os limites das cidades) e, consequentemente, o desenvolvimento de grandes centros metropolitanos como São Paulo, Rio de Janeiro, Porto Alegre, Salvador, Goiânia, Manaus, entre outros.
O desenvolvimento urbano é o ato de planejar o crescimento das cidades de forma a garantir o acesso seguro, justo e digno da população aos serviços urbanos, como mobilidade, infraestrutura, saúde, educação, qualidade ambiental, entre outros.
Planejamento urbano estatal
No urbanismo brasileiro, as práticas de intervencionismo estatal causaram grandes horrores às nossas cidades. Por meio de restritivas leis de zoneamento que procuravam “desenhar” uma urbe centralizadamente concebida, definindo estritamente o tamanho, as formas de ocupação e até mesmo os usos admitidos em cada terreno da cidade, é que assimetrias foram consolidadas e reforçadas, atividades econômicas foram esvaziadas, bairros perderam o dinamismo, o uso misto (hoje unanimemente reconhecido como salutar) se tornou raro ou mesmo proibido, e a diferenciação induzida pelo território provocou um aumento da desigualdade de preços entre as diferentes regiões das cidades.
Como exemplo máximo de intervenção estatal na forma de planejar uma cidade, está o caso de Brasília, praticamente um laboratório dessas ideias, fruto de um concurso público realizado em 1957 pelo próprio Estado, com júri formado majoritariamente por arquitetos e urbanistas e vencido por Lúcio Costa, um dos profissionais da área mais reconhecidos do Brasil àquela altura. Totalmente setorizada, é vista consensualmente como um exemplo a não ser seguido.
As cidades, na visão liberal, privilegiam o indivíduo e precisam ser mais humanas. Deve ser feita para aquele cidadão que caminha e quer vivenciar a cidade. Que precisa reocupar os espaços públicos: torná-los menos ociosos, explorar o potencial das ruas para criar mais interação entre as pessoas, transformá-los em áreas de estar (não encarar apenas como áreas de passagem) e diminuir a importância do carro. Essas características foram adotadas por diversas cidades europeias há muito tempo.
As áreas centrais das cidades estão sofrendo, em vários graus, os impactos do crescimento urbano. Um aspecto interessante e que merece atenção é o surgimento de centros alternativos, que passaram a disputar atenção e investimentos do centro “principal” dessas cidades, que, por sua vez, ficaram esquecidos. Sem incentivo para uso, chega o abandono, que traz com ele o aumento da criminalidade, desperdício de infraestrutura e desvalorização da região.
No entanto, surge também uma nova demanda, a de revitalização desses espaços, para que eles possam voltar a desempenhar seu papel para a população, desde o de imagem unitária de pertencimento à comunidade até o de amenidade, a fim de preservar a boa qualidade do ambiente construído para seu público mais diverso.
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As cidades, através do poder público, agentes comunitários e empresas privadas, respondem de maneiras diferentes a essa questão, mas é consenso entre as partes que o papel da reurbanização de tais áreas vai além de deixar a cidade mais bonita. Resgatar a história de espaços ou reconstruir patrimônios tombados fortalece o mercado e o comércio da região no qual estão inseridos, gera empregos direta ou indiretamente, e ainda cria um ambiente mais agradável para os moradores locais, que certamente ficarão gratos pelo feito.
Portanto, ao contrário de Brasília, o Brasil também possui casos extremamente positivos, Curitiba e Rio de Janeiro são alguns exemplos. Os curitibanos presenciaram um plano de revitalização bem orquestrado que permitiu o crescimento ordenado da cidade, a partir da década de 1960. O projeto cuidou da paisagem da cidade, ampliando a área verde da cidade, criou, ainda, novas regras de zoneamento e parques. O Calçadão de Curitiba foi todo redesenhado, proporcionando um belo contraste entre a rua de pedestres e as edificações e transformou a rua das Flores em um importante ponto comercial e de encontro de pessoas. A revitalização é um marco histórico e demonstra ser um empreendimento de sucesso imediato, pois atraiu novos moradores e visitantes à cidade e, consequentemente, aqueceu sua economia.
No Rio de Janeiro, o bairro da Lapa chama atenção pela transformação após uma série de ações que teve início na década de 1970 e chegou ao auge em 2005. Famoso pelos restaurantes, clubes de jogos e botequins e em estado de degradação, o bairro todo passou por reformas, tombamentos, revitalizações paisagísticas e ambientais que levaram à surpreendente valorização imobiliária local.
Tais exemplos ilustram tanto a importância quanto a viabilidade de se propor hipóteses de qualificação do espaço urbano, para que esses locais recuperem a relevância do passado na vida atual, compreendendo a constante transformação da população que podem ser um imóvel abandonado, uma praça sem cuidados, ou até construções maiores como, por exemplo, estádios.
Portanto o importante é o poder público e a iniciativa privada unirem-se para que se obtenha os resultados tão importantes para a população.
O planejamento urbano está intimamente relacionado com o desenvolvimento econômico da cidade. Um influencia diretamente o outro. Planejar a cidade dentro dos princípios liberais trará ao cidadão maior sensação de pertencimento e a necessidade de cuidar do espaço onde ele mora e que, por sua vez, trará junto a questão da sustentabilidade e da necessidade da preservação dos recursos naturais e ambientais.
*Paulo Gaspar é Arquiteto Urbanista formado na PUC Campinas em 1988.
Foto: Vanessa Bumbeers no Unsplash.